Tenho medo quando as palavras somem. Quando o papel prontamente fica em branco, sei que algo está errado. Quando as palavras somem eu me perco, finjo uma outra identidade, finjo que estou bem sem isso, que estou bem fingindo ser quem não sou.
Uma vez me disseram que eu tenho mãos de fada, que eu tenho o poder de colocar cores no mundo quando escrevo e revelo todo o universo que há aqui dentro. Quando as palavras somem, tudo fica preto e branco. Então silencio, me retraio, me escondo do mundo, difícil explicar o que está acontecendo quando nem você sabe o que está acontecendo de verdade.
Quando as palavras somem eu desapareço junto com elas. Os amigos perguntam o que aconteceu, os parentes desconfiam que é indolência de alguém que não se importa muito com nada (imagina se eles soubessem que estou assim porque me importo tanto tanto com tudo!) e eu me retraio e escondo mais ainda, porque não há o que explicar, porque não quero explicar. Essa semana me disseram que eu não preciso aguentar todo esse peso sozinha, mas até pra pedir ajuda é necessário usar palavras. E quando elas somem, como a gente pede? Eu não sei. Acho que nunca aprendi direito a fazer isso. Talvez porque eu sei que as palavras sempre voltam, elas sempre aparecem para me resgatar de mim mesma. Nenhum silêncio é eterno, ainda mais os meus silêncios, que fazem muito mais barulho do que as palavras. Então eu só sento, espero, tento me fazer surda aos julgamentos do mundo (mas eles doem, ah, como doem!) e aguardo o retorno do comichão na mão, as vozes (boas) na cabeça, o ritmo da poesia, as falas dos personagens, o enredo de um mundo que só eu sei contar. E quando a folha em branco volta a ser desenhada pelas minhas letras, respiro fundo e sorrio, sabendo que acabou, que posso voltar a caminhar, que posso me olhar no espelho e tornar a me comunicar. Quando as palavras voltam, eu também volto pra mim. E desejo, me ajoelho e faço uma oração, do fundo do meu tão sensível coração, que eu nunca, nunca mais desapareça junto com elas.
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