Sobre Palavras, Músicas e Despedidas.

piano

Os olhos cor de mel encontram os meus numa sala vazia e sombria.
O silêncio nos consome, o medo nos corrompe e palavras nos constrangem.
O que há mais a ser dito?
Depois de todos esses anos, depois de todos esses danos, o que há mais a ser dito?
Não há nada. Não há uma única sílaba, uma única letra, uma única saída.
O ponto final em nossa história já foi posto.
Se fui eu quem colocou, se foi você quem colocou, se foram os dois, exatamente ao mesmo tempo… Isso não importa.
Nossa história acabou.
Mas quem será o primeiro a cruzar a porta?
Quisera fazer-te uma canção de despedida, escrever-te uma letra de amor perdido, mas nem isso.
As palavras nos abandonaram de vez.
O que faremos? Como sobreviveremos?
Se não podemos usá-las, então toquemos.
Toquemos uma doce melodia qualquer. Seja de Mozart, Beethoven ou Chopin.
Toquemos, ainda que seja simples, fugaz, feita em um quarto escuro às duas da manhã.
Toquemos e evitemos o constrangimento.
Evitemos o desejo errôneo de insistir em estarmos um com o outro.
Dois artistas jamais poderão tocar juntos se não estiverem afinados. Se não estiverem na mesma freqüência, no mesmo tom. Do contrário, a música não acontece, as melodias não se cruzam e tudo o que resta são duas pessoas frustradas, que fizeram de tudo para conseguirem absolutamente nada.
Não é melhor evitarmos?
Oh, não é melhor deixarmos?
Devolvam-me meu piano e me deixem respirar. Por favor, vá para o seu quarto, toque sua música, enquanto eu ficarei aqui, sozinha, largada, deixada, tentando fazer a mesma coisa com a minha alma quase apagada.
O desejo gritante e agonizante de sua companhia nunca foi o bastante para mantê-la.
Talvez você tenha desejado a minha também ou talvez apenas tenha fingido por educação.
O fato é que nenhuma canção foi composta por esta dupla fracassada, por mais que nossas mentes criativas tenham adorado o processo de criação.
Devolvam-me meu piano e me deixem tocar. Deixem-me sentir os dedos flutuarem pelas teclas brancas e negras outra vez. Deixem-me sentir ser levada pela música, por aquele toque sutil que nenhum outro instrumento é capaz de executar.
Façam com que minha alma voe para longe, para tomar um descanso, deixando corpo pesado e cansado descansar de uma vez por todas.
Deixem-me viver de música.
Devolvam-me meu piano e deixem-me viver de música.
Eu não quero mais palavras; cansei delas.
Cansei de toda a sua repetição constante, das linhas ambíguas que dizem tudo e nada ao mesmo tempo. Cansei das inúmeras rimas, do barulho seco e vazio que produzem quando são criadas.
Quero o tom úmido do dó, ré, mi e o toque sutil e anestesiante do fa, sol, la, si.
Quero viver de música.
Da música que não mente, que não engana, que não esconde.
Que não mata, que não decepciona, como as palavras fazem com maestria.
Quero viver de música e me perder em toda sua melodia.
Pois já cansei de ser a garota estúpida que ainda escreve sobre contos de fadas e acredita em magia.

Os olhos cor de mel encontram novamente os meus numa sala vazia e sombria.
O silêncio ainda nos consome, o medo ainda nos corrompe e palavras ainda nos constrangem.
Nossas almas já sabem, já entendem que nossa história já está morta.
E no fim de tudo, eu sou a primeira a cruzar a porta.

Sobre Amores e Estações.

Acordo num sobressalto, após um pesadelo.
Meu corpo ainda treme de medo e o coração disparado no peito dificulta qualquer tentativa de respiração tranqüila. Estico o braço para o lado direito da cama, em busca de seu corpo, de seu abraço, de proteção, mas não há nada. Não há nada além do lençol amassado e o vazio deixado pela sombra de sua carne.
Ponho-me de pé e passo a mão pelo rosto. Escuto o barulho da louça vindo da cozinha e mordo os lábios, sem saber como começar. Sem saber como iniciar este dia tão distinto, tão cinza, tão sombrio. Apenas mais um dentre os muitos dias acinzentados que temos vivido.
Olho no espelho. A maquiagem borrada – que havia esquecido de retirar – denuncia todo o martírio de uma noite gelada e silenciosa. Pergunto-me o que estou fazendo. Pergunto-me por que ainda sigo aqui, com os pés descalços e os sonhos destroçados. Quando olho para você, tento vislumbrar qualquer resquício de esperança, qualquer fragmento de um amor que agora parece uma lembrança longínqua. Talvez eu veja essa luz ou talvez eu apenas a imagine. Porque ainda me custa acreditar que tudo está por acabar.
Você nega. Você diz que estou louca. Você me dá todos os adjetivos do mundo e beija minha cabeça de forma condescendente antes de ir para o trabalho. Promete que nada vai mudar, que somos os de antes e que sempre seremos. Tudo o que consigo fazer é esticar meus lábios com muita dificuldade em um sorriso amargo e tomar um café bem forte, enquanto meus olhos acompanham-te deixar esta casa.
Sinto-te cada vez mais longe. Sinto-te escorregando por entre meus dedos, como grãos de areia que escorrem por minha pele até tocar o chão. Por mais que tente agarrá-los, tudo o que sobra em minha mão são grãos de terra, que parecem não significar mais nada.
Os dias passam. O calor do verão se esvai com a chegada do outono.
As folhas secas se jogam sutilmente das árvores e meus olhos acompanham cada detalhe da natureza enquanto tento arranjar alguma forma de voltar ao passado. De voltar ao primeiro olhar trocado, à primeira sensação de borboletas no estômago e o arrepio gostoso que sobe e desce freneticamente pela espinha. De retornar ao primeiro beijo, às primeiras palavras românticas e das pioneiras promessas que cruzaram seus lábios em forma de algodão doce.
Mas não há como. A porta da máquina do tempo está trancafiada, me obrigando a viver no presente. Me obrigando a olhar o fantasma do que você já foi um dia e me forçando a aceitar isso.
A pior parte de tudo é que não consigo ir embora. Não consigo atravessar a porta, deixar seus olhos cor de mel para trás, junto com todos os sonhos, todas as palavras, todas as promessas. Não consigo pegar a mala e largar o seu sorriso, a sua gargalhada gostosa e a voz que por tantas vezes sussurrou em meus ouvidos que viveríamos para sempre.
Não posso. Não consigo. Sou fraca, incapaz, inútil… Não consigo.
Meu corpo sempre dá um jeito de pedir desesperadamente pelo seu. Mesmo estando tão perto, mesmo com toda a parede de gelo entre nós, eu ainda me sinto como uma adolescente, boba, apaixonada e admirada pelo homem que você é. Afinal, não é isso do que se trata o amor? Um pouco de admiração, uma carga de paixão e muita, muita frustração? Muita, muita rejeição? Não sei o que os poetas pensam, o que querem dizer com os textos melados e sem sentido, mas, para mim, é como parece. Porque quanto mais você me ignora, quanto mais você me despreza e finge não se importar, eu sinto vontade de continuar aqui, esperando o dia em que você voltará a me amar. Esperando, sempre esperando, o dia que retornaremos aos cenários épicos dos nossos melhores momentos juntos. É doentio, é insuportável, é repugnante essa necessidade de te ter aqui, de vê-lo sempre perto de mim, mesmo que não sinta mais o mesmo por mim. É ridículo, deplorável, deprimente, mas, infelizmente, não há nada que eu possa fazer.
O inverno entra pela porta mascarado de uma corrente de ar frio.
Você está trabalhando sobre a mesa da cozinha, enquanto eu sigo com minha caneca de café forte sobre os lábios, admirando cada gesto seu. Me dou conta de que apenas um “bom dia” saiu de sua boca hoje e o como isso dói. De como o silêncio se torna enlouquecedor em meus ouvidos porque vem de você.
Há outro me esperando. Há outro me amando, me querendo, me aceitando.
Mas que outro? Quem, como? Porque não há. Não em mim. Não no meu mundo. Porque dentro de mim, fora de mim, ao redor de mim só há você. Só há você e apenas você. Apenas você e sua frieza, sua indiferença, mas ainda assim você. Eu não sei o que fazer, como proceder, mas ainda assim você.
Minha cabeça continua gritando que estamos morrendo.
Mas meu coração lembra que, após toda morte, há renascimento.
E que de cada renascimento vem um vida completamente nova para se viver.
Coloco a caneca sobre a pia de mármore e seguro de repente seu rosto entre minhas mãos. Meus lábios capturam os seus em um gesto rápido, porém profundo. Passo a língua sobre minha boca após sentir o seu gosto e respiro fundo ao sentir o sabor das memórias que construímos juntos. Porém seu rosto continua impassível, como se não tivesse sido afetado. Você apenas abre um sorriso misterioso, que sou incapaz de decifrar, e continua fazendo seu trabalho.
Estamos tão perto e me dói, me dói tanto.
Estamos tão longe e me dói, me dói tanto…
Abro os olhos e posso avistar uma flor desabrochar sobre o vaso em minha janela, anunciando o início da primavera.
Não olho para trás, com medo de ver mais uma vez o seu corpo ausente e apenas um lençol amassado e vazio. Permaneço no mesmo lugar, exausta, morta por dentro, gelada por inteiro.
Não consigo imaginar minha vida sem sua agridoce companhia, sem um dia ao seu lado, mas não há mais jeito. Talvez consertar o que está quebrado seja uma perda de tempo, quando é mais fácil e melhor trocar por outro. Talvez persistir em um amor cinzento seja o mesmo que persistir em um erro, que só cometemos porque não admitimos ao próprio orgulho de que ele estava certo. De que perdemos e que, mais uma vez, nos perdemos.
Por causa do amor. Sempre por causa do amor.
Respiro fundo e decido que já está na hora de partir. Que já está na hora de levantar e partir.
Mas não consigo. Não por fraqueza, não por incompetência, não por covardia… Não; não dessa vez.
Pois, agora, o que me puxa na direção contrária é um cálido braço que faz meu corpo chocar-se de leve contra o dele, fazendo-me arregalar os olhos.
“Não vá”, sussurra em meus ouvidos, como se tivesse lendo meus pensamentos. “Não levante. Tive um pesadelo. Fique aqui. Preciso de você.”
“E se eu realmente precisar ir?”, respondi com a voz trêmula e os olhos inundados de lágrimas cristalizadas.
“O que seria de um dia meu sem você?”, ele responde com a voz suave, delicada como veludo. “É primavera. Fique aqui. Atravessamos o vazio outono e sobrevivemos ao gelado inverno. É primavera. Não há porque ir. Fique aqui”.
Eu fico.
Não respondo com palavras, apenas o abraço.
Eu fico.
Não dou explicação para o meu choro, ele sabe.
Eu fico.
Não digo que ainda o amo, ele sente.
Eu fico.
O amor cinzento pode tornar a ser azul celeste. Pode sim. Sei disso.
Eu fico.
Consertar algo é sempre melhor que trocar.
Eu fico.
Afinal, o que seria de um dia meu sem ele?
Afinal, o que seria de um dia dele sem mim?
E o que seria do mundo sem nós dois juntos?
Eu sempre fico. Sempre.
E esta história recomeça com o amor levantando-se após a longa e árdua batalha dizendo, com todas as letras, para o derrotado orgulho: “Você perdeu. Porque eu… Ah! Eu finalmente me encontrei”.

Inspirado da música “Que Sería?”, de Francisca Valenzuela.

Rosa e Eucalipto, parte 2.

parte 2

Meus olhos correm pela multidão à sua procura.
Caço seu par de olhos castanhos, seu sorriso sublime, sua presença adorável.
Procuro, caço, perscruto, mas você não está lá.
Olho o relógio pela milésima vez, observando que você está atrasado. Muito atrasado.
Meu coração palpita no peito em uma ansiedade irritante que não consigo arrancar daqui.
Ele bate, bate, bate; e cada batida é uma letra do seu nome que está tatuado bem dentro de mim.
Ele está gritando por você.
Será que não está ouvindo? Onde quer que esteja, não o está ouvindo? Não está me ouvindo?
Ele grita alto (com uma grande ajuda dos pulmões), esperando que você finalmente o escute e venha mais depressa.
Oh, como se atreve?
Como se atreve a apontar-me o dedo e dizer, com todas as letras, que não te amo?
Como se atreve me olhar nos olhos e duvidar do sabor mais doce que já provei nesta vida?
Estamos apenas algumas horas apartados e a falta do seu sorriso já começa a me enlouquecer.  Apenas horas, espaços medíocres de sessenta minutos, que parecem sessenta anos.
Minhas pernas tremem, batem contra o chão, contando os microssegundos que ainda restam para eu poder visualizar seu rosto outra vez.
Por que demoras tanto?
É algum tipo de castigo? É uma punição por ainda dividir meu coração?
O que você está fazendo comigo?
Não seja como o outro.
Não me faça entrar em desespero. Não comece a provocar espasmos espinhentos por todo o meu corpo que me fazem sangrar absurdamente.
Você é a única cura para o meu vício mortal e impiedoso.
Você é sanidade para a minha loucura, a luz para a minha enorme escuridão.
E, cima de tudo e de todas as coisas, você é aquela explosiva vontade de viver, quando desejo mais do que nunca desaparecer deste mundo.
Oh, como se atreve?
Como se atreve a dizer que não te amo o bastante?
Ainda estou aqui, esperando, roendo o último que sobrou de minhas unhas e com um coração latente que continua a berrar seu nome sem cessar.
As pessoas falam comigo, puxam assuntos banais e tudo o que eu consigo fazer é presenteá-las com um sorriso amarelo e sem graça.
Eu não quero estar com elas.
Não quero conversar com elas, não quero ouvi-las ou ter de fingir uma tranqüilidade que estou longe de sentir.
Eu quero estar com você.
Viver você, respirar você, amar você.
Eu quero estar por cima de você, por baixo de você, dentro de você.
Eu quero você e todo o seu amor que corre por entre minhas veias, deixando o rastro hipnotizante de  Rosa com Eucalipto.
E a sensação de frescor e doçura arrebata-me por inteiro quando vejo sua silhueta ao longe. Você é apenas mais um ponto na multidão, quase como um fantasma do próprio corpo, mas é o bastante.
Oh, Deus, como é o bastante!
Seu andar, seu jeito, todo você.
Suas mãos, seu olhar, seu sorriso, todo você.
Seu cabelo perfeito, a cor de sua pele, todo você.
Oh, como se atreve?
Como se atreve a duvidar de toda essa carga que me atinge com tão só vê-lo?
Se isso não é amor, o que é, então?
Explique-me, diga-me… O que é?
Se eu tivesse de escolher uma cor para este sentimento, escolheria o azul.
Isso mesmo…  azul.
Porque o que sinto nada se assemelha ao rosa melado dos amores juvenis ou ao vermelho sangue da paixão carnal dos adultos.
É azul. Azul celeste, como o céu claro que vive sobre nossas cabeças.
É azul perfeito como a cor dos oceanos. É azul reluzente como uma flor exótica, raramente encontrada em lugares simplórios.
É o azul da morada dos anjos. A mesma morada onde possui uma piscina de rosas por toda a água límpida. Uma piscina de rosas e com cheiro de eucalipto.
Azul da morada para onde iremos após partirmos deste mundo. Juntos.
O fantasma de você se transforma em sua forma de carne e osso conforme vai se aproximando.
Olho para as minhas mãos e percebo que estou tremendo. Fecho os dedos, respiro fundo, tento manter o controle, mas é impossível. Meu corpo inteiro está reagindo ante à presença eminente do seu. Meus dedos tremem tanto que mal consigo pegar a alça da minha bolsa e colocá-la sobre o ombro.
Já estou de pé; já estou com os braços ansiosos para abraçar sua figura como se não houvesse amanhã.
Seu sorriso cai como uma cachoeira sobre meu corpo, como gotas cristalizadas de chuva após um longo período de sol escaldante.
Oh, como se atreve?
Como se atreve dizer que não é amor?

— Desculpe o atraso. – você diz baixinho, com sua voz carinhosa e arrependida, antes de beijar meus lábios, pondo um fim em toda esta agonia.
— Não tem problema. – repliquei ao mesmo tempo que passei o braço esquerdo ao redor de sua cintura. – O que importa é que está aqui agora. Desde que sempre esteja, desde que sempre chegue… Não tem problema.
— Vamos para casa? – perguntou enquanto começávamos a caminhar por toda a multidão de pessoas como se estivéssemos completamente sozinhos.
— Será que não vê? Será que não entende? – encarei seus olhos confusos antes de terminar a sentença e sorri. – Eu já estou em casa.

Rosa e Eucalipto.

parte 1

— Você me cura. – ela sussurrou num quarto escuro, enquanto sua mão deslizava delicadamente pela bochecha do rapaz. – Sempre que me sinto doente, sempre que acho que vou perecer ante o olhar que tanto me faz mal, você chega e me segura. Você chega e me cura. E eu te amo por isso.
— Não da forma como o ama. Não da forma como eu te amo. – respondeu com certa amargura, deixando que as garras do ciúme penetrassem em seu puro coração. – Eu não consigo fazer sua cabeça girar. Eu não faço você sentir tonturas ou chorar de agonia. Eu não tenho o mesmo efeito sobre você que ele tem. Eu não te faço passar mal de amor, não faço sua pele queimar dolorosamente. Como ousa dizer me amar? Eu não sou ele. E jamais poderei ser.
— Você é melhor. – respondeu com meiguice, bloqueando as palavras enegrecidas que saíam dos lábios de alguém tão especial. – Será que você não sabe? Esse é o melhor tipo de amor. O amor que acalma ao invés de rasgar o coração. O amor que canta suavemente lindas melodias ao invés daquele que berra em seus ouvidos, ao ponto de deixar-lhe louco. O amor que faz você sentir estar no lugar certo. O amor que parece uma bênção, como gotas cristalizadas de chuva após um longo período de sol escaldante. O amor que acende uma alma, não aquele que a martiriza com pensamentos enlouquecedores e suicidas. – ela pegou com cuidado a mão rija sobre o lençol branco e depositou um singelo beijo sobre sua palma. O beijo lhe causou uma sensação extasiante, fazendo um caminho fresco por sua pele, que sabia a uma mistura de rosa com eucalipto. – Será que não vê? O melhor amor é o que faz viver, não o que mata. E o seu amor me faz querer viver mil encarnações ao seu lado, não importa quantas vezes o mundo queira cair ao meu redor.
— Ainda assim… – insistiu, mesmo tendo de lutar contra o efeito anestésico de seu beijo. – Você sempre irá amá-lo também.
— Isso não significa que eu não tenha feito uma escolha. E eu escolho você. Eu sempre vou escolher você.

Os braços carinhosos envolveram seu pescoço, calando-o de uma vez.
O silêncio pesou sobre o quarto escuro enquanto aquela sensação refrescante ainda tomava-o por inteiro, como um feitiço mágico que o impedia de ir embora.
Que o impedia de sair para procurar um coração que pudesse vir a ser inteiramente dele.
Porque ele não conseguia, ele não podia largar a rosa e o eucalipto que sempre navegavam por suas veias cada vez que ambos se roçavam.
Mas quando ela o tocava assim, quando o fazia sentir-se especial, despido de todos os pesadelos, em sua máxima vulnerabilidade, ele entendia o que era a calmaria de um amor puro e sincero do qual ela falava.
Entendia perfeitamente o que era o refresco de gotas cristalizadas de chuva após um longo período de sol escaldante.
Sentia a alma acendida, viva, desejando viver mil encarnações ao lado dela, não importava quantas vezes o mundo desejasse cair ao seu redor.
Porque – ainda que dividido – o amor dela o curava.
E – infelizmente ou não – era disso, somente disso que ele precisava para continuar respirando neste mundo.