Uma História Sobre O Medo Em V Atos

I.

O medo tem a cara de um homem.
Não sei descrever seus traços, seus cabelos, sua voz ou seu tamanho.
É apenas um homem.
Medo.
Gênero masculino.
Medo, com seus braços largos que apertam e machucam, com suas mãos que esmagam meus ossos, com seus lábios vermelhos de escárnio, com sua boca suja de sangue.
O meu medo tem a cara de um homem.

II.

Um dia, uma amiga me explicava o que era o amor.
Como era estar apaixonada, como era bom ser tocada, apreciada, amada.
Como era bom não sentir dor.
Eu olhei para ela com curiosidade, como alguém que escuta uma língua nova, uma língua nunca antes detectada pelos ouvidos.
“Entenderei o que é o amor o dia em que eu não sentir medo.”
Disse para o vazio, enquanto ela cantava para si mesma uma canção apaixonada.

III.

Percebi que havia algo estranho quando você andou ao meu lado e eu não senti medo.
Lembro de olhar para nossos pés, lado a lado, e nossos passos pisarem na mesma cadência, na mesma direção.
Não era normal. Eu nunca antes havia deixado os pés de um homem pisarem na mesma cadência que os meus.
Percebi que havia algo estranho quando seus olhos chamaram os meus olhos e eu não senti medo. Lembro de sentir que não era a primeira vez que eles se encaravam.
Não era normal. Eu nunca antes havia encontrado pela primeira vez alguém que eu já conhecia.
Você percebeu que havia algo estranho quando se encontrou no meu olhar e sentiu medo.
Não era normal. Você nunca antes havia permitido se reconhecer dentro dos olhos de uma mulher.
Você então mudou o ritmo de seus pés, seus olhos foram chamar outros olhos, de preferência olhos que não o refletissem.
(É mais fácil assim, não é?)
O seu medo ainda tem o meu rosto.

IV.

Uma música lamentosa ressoa sua melodia no fim da noite.
Diz a letra:
“Você chegou tarde demais para mim, eu cheguei cedo demais para você.”
É isso.

V.

Sinto muita falta de não sentir medo.

Lobos.

wolf

Inspirado na música “Hunters And The Wolves”, por Delta Goodrem.

Os lobos me perseguem diariamente.
Posso ver suas presas em um sorriso malicioso e indecoroso.
Posso ver a salivação em suas bocas em um desejo irrefreável e pavoroso.
Ouço seus uivos crescentes e indecentes em meus ouvidos, impregnando meu cérebro com imagens pecaminosas.
Acreditam que sou uma presa fácil e que meu corpo seria uma deliciosa fonte de prazer.
Eu poderia deixá-los me pegarem, me usarem, me matarem com suas garras sujas e luxuriosas.
Eu poderia deixá-los fazer o que quiserem comigo e ainda pediria por mais.
Mas me contenho.
Evito, disfarço, me escondo.
Finjo que não vejo, finjo que não sinto, finjo que não ouço.
Finjo que eles não existem.
E talvez não existam mesmo.
Pelo menos não no mundo onde você existe pra mim.
Não da forma que você existe pra mim.
Mas você é apenas um cachorrinho apavorado no meio dessa enorme matilha.
És apenas o menor animalzinho que não tem coragem de se aproximar e dar a primeira mordida.
Meu corpo seria todo para você, se ao menos o quisesse.
Minha alma seria toda para você se ao menos a quisesse.
Eu poderia fazê-lo o homem mais feliz do mundo se ao menos quisesse.
Mas você não vem.
Você finge não ver, finge não notar, finge não desejar, exatamente como faço com os outros, nesta interminável cadeia alimentar.
Eu estou preparada.
Estou preparada para deixá-los me pegar, para deixá-los me devorar como um pedaço de carne descartável. Mais do que preparada, eu quero que eles o façam.
Quero que possuam meu corpo, alimentem-se de toda esta carcaça que restou de mim e acabem com esta frustração interminável que é viver sob uma pele como a minha.
Quero que tirem todo o prazer que tem para tirar e me permitam finalmente respirar.
Eles se aproximam cada vez mais e sinto que estou pronta para me entregar.
Olho para você uma última vez e tudo o que fazes é se afastar.
Você desistiu antes mesmo de começar.
Eu sou a presa fácil que todos eles estão lentamente a devorar.
Eu sou aquela mulher frustrada que nunca poderá te amar.
Acabou.
Poderia ser você.
Oh, como poderia ser você!
Exatamente como deveria ser eu…

Little Dreamer.

clouds

Hello, como você está?
Eu sinto sua falta. Faz tempo que não te vejo. Você nunca mais veio me visitar em sonhos. Sinto falta de olhar em seus olhos. Nem que seja por poucos segundos.
Mas me diga, como está? O mar é mesmo tão azul como dizem? As flores possuem mesmo cores vibrantes? Me diga… Me diga como é se sentir leve. Você carregava um peso tão grande aqui… Espero que agora possa flutuar como o vento.
Hoje não é nenhum dia especial. Hoje não é seu aniversário e nem o dia ou o mês que você se foi. Mas eu não preciso de motivos para pensar em você. Eu faço isso todos os dias. Todo o tempo. Porque você está aqui dentro.
Sinto falta de tudo em você. Da sua risada peculiar, que às vezes me pego imitando. Do seu cabelo lindo e perfeito, que eu tanto admirava. Você sabia o quanto eu o amava, certo?
Sinto falta das conversas sobre música boa, sobre o que são verdadeiramente. Seus comentários azedos me divertiam. Você era (é) tão inteligente. Sinto falta até de quando me xingava. Nunca pensei que fosse sentir falta disso. Mas eu sinto.
Hey, me diga… Você conseguiu nosso Johnny Bravo? Guarde um pra mim. Um dia estarei aí. Guarde um lugar pra mim também, logo atrás de você. Exatamente como era todos os dias. Quando eu chegar aí, quero mexer nos seus cabelos de novo. E ver aquele sorriso lindo em seu rosto. Você ficava mais linda ainda quando sorria. E desejo que faça muito isso hoje em dia.
Quando você nos deixou, eu me culpei. Nossos últimos dias não foram os melhores. Eu tive dúvidas. Pra falar a verdade, até hoje tenho. Mas isso não importa agora. Não mais. Porque eu sei e tenho plena certeza do que eu sinto. E, por enquanto, isso é o bastante.
Espero que escute minhas palavras diárias. Espero que escute meus pensamentos diários, onde eu digo tudo o que eu, por um motivo ou outro, não pude dizer aqui. Espero que esteja me vendo. Espero que, sempre quando estiver livre, esteja por perto.
Eu sei que você deve estar fazendo um trabalho fantástico. Eu sei que está. Esse sempre foi seu objetivo. E você é brilhante em tudo o que faz.
Saiba que eu te amo e sempre te amei, apesar de tudo. E um dia eu estarei atrás de você outra vez. Como nos velhos tempos.
Nunca se esqueça de mim.
Te vejo na outra vida ♥

So long my little dreamer, I’ll miss your face… We’ll always stay connected through time and space…

Metamorfose Ambulante.

cama

“Prefiro ser essa metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo”

(Raul Seixas)

Não sou a mesma que fui ontem. O mundo gira sem parar, assim como minhas opiniões acerca dele. As coisas mudam, as pessoas também. E eu… eu me transformo a cada hora.
Meus olhos observam o mundo ao redor na mesma velocidade que o tic-tac do relógio. Eu penso o tempo todo, mudo todo o tempo. Mas nunca sem coerência.
Falta de personalidade é defender uma ideia hoje somente porque a defendeu ontem. Defenda o que quiser, mas defenda sabendo que tudo pode mudar amanhã. Eu falo o que me parece correto naquela hora, ainda que saiba que passo longe da verdade absoluta. Mas defendo porque acredito no que defendo. É a minha verdade. Errada ou não.
Pra isso que o mundo gira. Pra me mostrar o quanto estou certa. Pra me mostrar o quanto estava estupidamente errada.
Peço perdão pelos meus erros e aprendi a me perdoar por eles. Porque não fiz por mal. Porque defendia uma ideia equivocada. Mas o dia chega e eu mudo. Graças a Deus.
Então ame a metamorfose ambulante de ontem, hoje e amanhã. Não me entenda, não se esforce tanto. Porque amanhã talvez mude novamente. Talvez erre. Talvez seja a minha vez de perdoar.
Talvez tudo irá mudar. Sim… tudo irá mudar.