Lobos.

wolf

Inspirado na música “Hunters And The Wolves”, por Delta Goodrem.

Os lobos me perseguem diariamente.
Posso ver suas presas em um sorriso malicioso e indecoroso.
Posso ver a salivação em suas bocas em um desejo irrefreável e pavoroso.
Ouço seus uivos crescentes e indecentes em meus ouvidos, impregnando meu cérebro com imagens pecaminosas.
Acreditam que sou uma presa fácil e que meu corpo seria uma deliciosa fonte de prazer.
Eu poderia deixá-los me pegarem, me usarem, me matarem com suas garras sujas e luxuriosas.
Eu poderia deixá-los fazer o que quiserem comigo e ainda pediria por mais.
Mas me contenho.
Evito, disfarço, me escondo.
Finjo que não vejo, finjo que não sinto, finjo que não ouço.
Finjo que eles não existem.
E talvez não existam mesmo.
Pelo menos não no mundo onde você existe pra mim.
Não da forma que você existe pra mim.
Mas você é apenas um cachorrinho apavorado no meio dessa enorme matilha.
És apenas o menor animalzinho que não tem coragem de se aproximar e dar a primeira mordida.
Meu corpo seria todo para você, se ao menos o quisesse.
Minha alma seria toda para você se ao menos a quisesse.
Eu poderia fazê-lo o homem mais feliz do mundo se ao menos quisesse.
Mas você não vem.
Você finge não ver, finge não notar, finge não desejar, exatamente como faço com os outros, nesta interminável cadeia alimentar.
Eu estou preparada.
Estou preparada para deixá-los me pegar, para deixá-los me devorar como um pedaço de carne descartável. Mais do que preparada, eu quero que eles o façam.
Quero que possuam meu corpo, alimentem-se de toda esta carcaça que restou de mim e acabem com esta frustração interminável que é viver sob uma pele como a minha.
Quero que tirem todo o prazer que tem para tirar e me permitam finalmente respirar.
Eles se aproximam cada vez mais e sinto que estou pronta para me entregar.
Olho para você uma última vez e tudo o que fazes é se afastar.
Você desistiu antes mesmo de começar.
Eu sou a presa fácil que todos eles estão lentamente a devorar.
Eu sou aquela mulher frustrada que nunca poderá te amar.
Acabou.
Poderia ser você.
Oh, como poderia ser você!
Exatamente como deveria ser eu…

Deveria Ser Eu.

red shirt

Deveria ser eu.
A que aquela camisa vermelha te deu.
A digna de toda a atenção dos olhos teus.
A que deveria estar ao lado seu
Desde o dia em que nasceu
Desde o momento em que cresceu
E até na primeira vez em que seu coração adoeceu.
Deveria ser eu.
A primeira a beijar os seus lábios quando a esperança em seu coração morreu
A primeira que viu suas lágrimas caírem quando anoiteceu
E a primeira que as enxugou quando amanheceu.
Deveria ser eu.
No seu momento mais baixo
Ou no seu apogeu.
Ouvindo os assuntos mais banais
Como o quanto a derrota do seu time te entristeceu
(Mesmo que este não seja o mesmo que o meu!)
Ou brigando contigo porque trabalhou tanto que até de comer esqueceu.
Deveria ser eu.
É…Deveria ser eu.
Mas não sou.
Mas não somos.
Ainda.
Talvez.
Não sei.
Juro que não sei.
Só sei que deveria ser eu.

Um Comportado Soldado.

soldado

Sou o maioral.
O garoto prodígio.
O menino especial.
E o homem com sangue patrício.
Não possuo sentimentos, não me interessa mais o conhecimento e de qualquer relação mais profunda me isento.
Uso termos pejorativos, acho tudo enjoativo e nunca me sinto entretido.
Nada me fere, nada me abala.
Nada me confunde, nada me atrapalha.
Sou um comportado soldado.
Bato continência à sociedade e obedeço determinado ao padronizado comportamento social.
Sigo meu capitão com a farda impecável e possuo uma autoconfiança invejável.
Sou descolado, nunca ignorado e sempre passo longe dos mal amados.
Consigo falar de absolutamente nada usando mil palavras e sempre danço conforme a música tocada.
Eu sei de tudo.
Eu sei de todos.
Eu sei de mim.
Será mesmo?
Vamos tentar de novo.
Vamos começar outra vez.

Sou o maioral.
O garoto prodígio.
O menino especial.
E o homem com sangue patrício.
Sou sentimental, às vezes passional e sinto diariamente um vazio abissal que não consigo preencher com qualquer coisa normal.
Tudo me fere, tudo me abala.
Tudo me confunde, tudo me atrapalha.
Finjo-me de um comportado soldado porque não suporto mais ser desprezado, destruído, excluído, e sou obcecado com o reflexo que vejo no espelho.
Porque não enxergo, não entendo, não compreendo o motivo de não ter sido o escolhido.
Não aceito, não posso, não consigo entender porque ela o encontrou, porque ela se entregou, porque ela o amou.
Porque ela me deixou, porque ela me olvidou e me largou aqui neste mar vazio assombroso, espantoso, revolto e desolador.
Sou um soldado comportado, padronizado, obedeço a um capitão porque estou perdido em solidão, ironicamente, em uma vasta multidão de pessoas que não conseguem me preencher.
Estou desesperado.
Quero atenção, quero compaixão, mas não sei como expressar toda essa confusão.
Estou revoltado, paralisado, amargurado com todo o desprezo, com tão pouco caso.
Mas ninguém pode ver, oh não!
Ninguém pode ouvir, ninguém pode saber, oh não!
Homem não chora, homem não se enamora ou molha a cama quando uma mulher vai embora.
Por isso, levanto a cabeça, dia após dia, e me escondo.
Escondo-me de meus sentimentos; enterrei-os em algum lugar dentro de mim e desejo nunca mais encará-los nesta vida.
Misturo-me à multidão para que o barulho dessas vozes banais e superficiais bloqueim o eco do grito desesperado de minha alma.
Comporto-me como eles para esquecer de mim.
E consigo até acreditar que sou medíocre assim.
Eu sei de tudo.
Eu sei de todos.
Mas não sei de mim.
Ainda não aprendi a encarar a imagem refletida no espelho e nem sei como fazê-lo.
Ainda não aprendi a olhar alguém diretamente nos olhos, pois temos que esse alguém consiga ver o que não quero ver; o que me recuso a enxergar.
Que possam notar que possuo toda essa fragilidade tão vulgar estampada em meu olhar.
Mas ninguém pode ver, oh não!
Ninguém pode ouvir, ninguém pode saber, oh não!
Porque eu sei de tudo.
Porque eu sei de todos.
E acredito que sei de mim.

Eu sou o maioral.
O garoto prodígio.
O menino especial.
E o soldado com um orgulho imortal.

A Casa Dos Gritos.

scream

Parem de gritar. Parem agora.
Vão embora e jamais sequer pensem voltar em outra hora.
Vocês não veem?
Vocês não sentem?
Nessa casa cheia de gritos, há uma garota debaixo da cama.
Nessa casa cheia de gritos, todos os cômodos já foram entupidos de drama.
Parem os gritos.
Apenas parem.
A mente da menina não aguenta mais.
As pequenas mãozinhas não conseguem bloquear a passagem dos sons estridentes e sem sentido que atropelam as frestas da porta, prontos para agarrá-la.
Prontos para fincarem suas unhas em uma sanidade há muito abalada.
Será que não vocês não veem?
Será que vocês não sentem?
Os anos passam, o mundo muda, mas os ecos de uma família quebrada vão terminar por deixá-la surda.
Será que não veem?
Não, eu sei que não.
Tenho certeza que não.
Porque vocês não enxergam.
Não possuem olhos, não possuem ouvidos, não possuem sentimentos.
Porque vocês só sabem gritar, gritar e gritar.
Vocês só sabem gritar até conseguirem o pulmão estourar.
Vocês só sabem gritar até a voz falhar.
E a pior parte de tudo é que ela nunca falha!
A garota debaixo da cama não agüenta mais.
Isso não é vida!
Porque em uma casa de gritos simplesmente não há saída.
Será que um dia vão conseguir ver?
Como esta garota irá crescer?
Como ela conseguirá viver sem enlouquecer?
Ela não poderá, certo?
Porque ela já enlouqueceu.
Porque qualquer lugar onde as vozes se manifestam em um tom mais elevado já é motivo para se sentir em um inferno na Terra.
Ela não poderá, certo?
Porque uma multidão  gritante já lhe é apavorante.
E todo esse pavor é motivo para mais gritos. Gritos internos, gritos com ecos, que ressoam contra paredes escuras e vazias de um organismo doente.
Será que nunca conseguirão ver?
Será que nunca conseguirão entender?
A garota tapando os ouvidos debaixo da cama quer finalmente viver.
Pois nessa casa gritos ela não quer mais perecer.
Por isso, parem de gritar. Parem agora.
Parem de gritar e vão embora!
E jamais, sequer, pensem em voltar outra hora.

Uma Dorzinha.

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Uma dorzinha
Aqui dentro
Que vai subindo
Até meu pensamento

Uma dorzinha
Anormal
Que só irá sarar
Com o sorriso de alguém especial

Uma dorzinha
Irritante
Que só piora
A cada instante

Uma dorzinha
De saudade
Que ninguém jamais
Pode saber de verdade

Uma dorzinha
Que não tem pausa
E que apenas está aqui
Por sua causa

Uma dorzinha
Que está se tornando um verdadeiro problema
Mas que acabou se transformando
Em um pequenino poema.